Janete da Rocha Machado
Historiadora e professora
Durante muitos anos, o Arroio Capivara serviu como demarcador das terras dos primeiros estancieiros, região onde hoje se encontram alguns bairros da Zona Sul. As águas do arroio faziam fronteira entre as escassas fazendas e o Guaíba. Dizem os mais antigos que o nome deriva do fato de existirem muitas capivaras, animal típico do sul do Brasil, cujo habitat são as proximidades dos rios e arroios. O fato é que o Arroio Capivara serviu, durante muitos anos, à população local, ajudando a desenvolver a economia da Zona Sul da cidade. As águas, provenientes de fontes da Vila Nova e de Belém Velho, eram utilizadas para irrigar a plantação e dar de beber ao gado leiteiro. Entre essas poucas fazendas existentes no local, encontrava-se a gleba de João Batista de Magalhães, mais conhecido por Juca Batista. Situada onde é hoje o bairro Ipanema, a chácara de Juca Batista foi símbolo de prosperidade e opulência na região.
Juca Batista:
o grande pioneiro da Zona Sul
De origem portuguesa, Juca Batista tornou-se um próspero comerciante. Juntamente com sua esposa, Otília Flores de Magalhães, Batista empreendeu nas terras deixadas por seu pai, cerca de 80 hectares, um império fundamentado no trabalho e na ajuda ao próximo. Nascido no século 19, Juca soube aproveitar a prodigiosa natureza da região, desenvolvendo a plantação de árvores frutíferas e a criação de gado leiteiro. A extensão de suas terras abrangia desde o Belém Velho até o atual bairro Ipanema. Sua residência ficava nas imediações da avenida que hoje leva seu nome – estrada que, no passado, apesar do chão batido, era a única possibilidade de deslocamento entre o Centro e a Zona Sul da cidade. O asfalto só viria bem mais tarde, na década de 1930, uma iniciativa do então vereador Flores da Cunha. Também eram limites de suas terras, a Lomba do Capitão Alexandre, atualmente conhecida por Avenida da Cavalhada, e as terras de Bernardo Dreher, onde hoje estão os bairros Pedra Redonda e Jardim Isabel e o Morro do Osso.
Por muitos anos, Juca Batista empreendeu ações em prol da comunidade carente, tanto de sua região como nas vizinhanças. Deslocando-se, de barco, pelo rio, fornecia produtos oriundos de sua fazenda a outras regiões da cidade. Em 1896, presenteou aos pioneiros colonos italianos da Vila Nova com as primeiras mudas de árvores frutíferas e verduras. Também ajudava a manter, por meio de um trabalho social, algumas instituições de caridade, entre elas a Santa Casa de Misericórdia, o Pão dos Pobres e o Asilo Padre Cacique, desenvolvendo assim, seu lado filantrópico. Em plena Primeira Guerra Mundial, diante da crise e do racionamento de alimentos, Juca Batista entregava ranchos aos pobres das vizinhanças. Em 1917, teria recebido do Exército Brasileiro uma faca de ouro gravada com agradecimentos. Na ocasião, Juca permitiu a utilização da beira do rio, parte integrante de sua propriedade, para os soldados em treinamento militar. Anos depois, na beira da praia, as terras de Juca Batista transformaram-se no Balneário Juca Batista.
Juca Batista foi ainda fundador da primeira casa comercial no bairro, a “Ferragem Juca Batista”, possibilitando aos moradores locais o acesso a diversificados produtos. Inaugurada em 1878, a antiga casa de campanha era o local onde se podia comprar de tudo: desde o alfinete até alimentos perecíveis como açúcar e o café. Era um estabelecimento típico de “secos e molhados”, onde a população local recorria sempre que necessitava.
Juca Batista doou uma parte de suas terras para a construção do cemitério da Vila Nova. Anos mais tarde, ele cedeu outro lote para edificação da escola hoje denominada Escola Estadual Odila Gay da Fonseca, em Ipanema. Hoje, o nome de Juca Batista é lembrado em avenida e linha de ônibus, que liga Ipanema ao Centro de Porto Alegre, uma forma de homenagear aquele que foi o grande pioneiro da Zona Sul.